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21 de setembro de 2011 Desenvolvimento Econômico

Lixo que emprega, alimenta e dignifica

Coletora de recicláveis enfrenta intempéries, frio e fome no Aterro Municipal de Rio Claro durante anos, mas com o incentivo da Prefeitura supera dificuldades e ajuda a criar cooperativa de recicláveis, onde é presidente há nove anos

O vento levanta a poeira da estrada de terra que leva ao barracão da cooperativa de recicláveis, ao som constante da britadeira. Neste cenário, adentra o portão o sexto e último caminhão baú que traz os materiais coletados no dia, ao término de mais uma jornada de trabalho. A porta do veículo se abre e dele saem dezenas de catadores, dentre eles Inair Francisca da Rocha Marcelino (45), piracicabana sofrida, residente na área rural de Rio Claro desde criança, que há 19 anos atua na coleta de material reciclável.

Com o sorriso estampado no rosto e a mesma disposição de sempre, Inair ajuda a tirar do baú e arrastar para o depósito, um dos sacos com o material coletado a ser selecionado, prensado e vendido.

Há nove anos Inair trabalha na Cooperativa, que desde março encontra-se em um barracão localizado no Distrito Industrial, onde o espaço é mais amplo e o reciclável vem limpinho, quase sem cheiro.

Mas, nem sempre foi assim. Inair começou sua vida de catadora de materiais recicláveis no Aterro Sanitário de Rio Claro, conhecido como lixão. Deixava o marido doente em casa e levava consigo os quatro filhos adolescentes para engrossar e coleta. Como ela, faziam o mesmo inúmeras outras pessoas, também necessitadas, que não tinham recursos para sustentar o lar.

Inair conta que o lixo recolhido no Aterro era vendido a terceiros, ajudava na sobrevivência de sua família, mas não rendia o suficiente para assegurar uma vida com um mínimo de dignidade. “Algumas pessoas recolhiam embalagens fechadas de alimentos vencidos que os supermercados descartavam no lixão, correndo o risco de contaminarem-se, mas eu não, nunca levei alimento do lixo para casa. As assistentes sociais da Prefeitura passaram a ir até o Aterro para nos conscientizar sobre os riscos que corríamos, acenando com propostas de ajuda para a formação de uma cooperativa”.

Segundo Inair, na época a prefeitura mobilizou várias secretarias, dentre elas a então Sedeplama (Secretaria Municipal de Desenvolvimento, Planejamento e Meio Ambiente) e a Secretaria Municipal de Ação Social, para tirar essas pessoas do lixão e ajudá-las a conquistar uma vida mais digna. Como as pessoas não entendiam e não acreditavam em promessas, foi preciso reforçar a segurança no Aterro de forma mais drástica, uma vez que os catadores, quando eram retirados, rompiam os aramados e voltavam para o Aterro, pondo em risco a própria saúde e de suas famílias.“Muitas vezes eu mesma corri dos guardas que atiravam para o alto na tentativa de nos assustar, mas acabei convencida da necessidade de deixar o aterro pela dona Luci, que antes era diretora da Ação Social e hoje é a secretária” diz Inair.

Foi nesse período que alguns catadores resolveram aguardar promessa da administração municipal de então, de que teriam um barracão próprio e receberiam ajuda na constituição da Cooperativa. A Prefeitura disponibilizou, enfim, um barracão bem grande na Vila Martins, onde teve início o trabalho e a criação da Cooperviva – Cooperativa de Trabalho dos Catadores de Materiais Reaproveitáveis de Rio Claro, originalmente com 20 cooperados.

Mais tarde, os coletores tiveram seu espaço reduzido em um terço e a luta tornou-se ainda mais árdua para que chegassem até os dias de hoje, com tempos infelizes e sem muitas perspectivas.

A presidente da Cooperviva relata que, com a entrada do governo Du Altimari /Olga Salomão, novas esperanças surgiram. A prefeitura começou a procurar um barracão mais amplo para o trabalho, até que encontrou um espaço localizado no Distrito Industrial, que possibilitava a ampliação da atividade dos coletores. “Embora com muitos problemas no telhado e falta de sanitários, o barracão é bem maior e, em março de 2011 retomamos o trabalho a todo vapor. Ampliamos a cobertura dos bairros de 15 para 22, dobrando a quantidade de materiais recolhidos. Se antes enchíamos três caminhões por dia, hoje enchemos seis” relata Inair.

A administração atual providenciou o reparo do telhado e a construção de sanitários. Como o terreno é espaçoso, hoje a prefeitura trabalha na construção de um novo barracão, refeitório e cozinha, os quais deverão ser inaugurados nos próximos meses.

Embora coordene todo trabalho junto aos cooperados, Inair não se sente diferente dos demais catadores e trabalha ainda mais que os companheiros. Chama para si a responsabilidade de estar junto com os coletores na busca de materiais de bairro em bairro, especialmente naquele nos quais já conquistaram a confiança e o respeito dos doadores.

“Graças ao apoio de tanta gente boa, aqui na Cooperviva me sinto em casa e feliz. Meus filhos hoje estão bem, seguiram seus destinos, e eu me sinto realizada coletando lixo, ajudando os catadores a se firmarem e, assim, colaborando também com a preservação do meio ambiente”, resume essa valorosa mulher.

Sobre a Cooperviva:

A cooperativa hoje é vinculada à Sepladema, que tem o apoio da Ação Social. Recolhe, em média, 45 toneladas de recicláveis ao mês, na maioria papelão, latas de alumínio e cobre, materiais que dão maior lucro. Depois de separados, os materiais são transportados e prensados no espaço da Vila Martins. As vendas ocorrem a cada 15 dias. A idéia da Cooperviva é trazer a prensa para o novo barracão quando este estiver concluído, o que facilitará as ações.

O lucro mensal da cooperativa gira em torno de R$ 30 mil, sendo que cada cooperado recebe, em média, R$ 700,00. O restante do lucro é depositado em poupança para o pagamento das taxas de INSS, abono de natal, salário e férias.

Além de serem registrados, os cooperados recebem cesta básica mensal e cesta de produtos naturais e orgânicos semanais, contendo verduras, frutas e legumes, providenciados pela Ação Social junto ao Banco Municipal de alimentos.

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