Feche os olhos e sinta o som da chuva caindo mansamente, depois com maior intensidade e, por fim, extinguindo-se aos poucos, restando apenas o ruído das goteiras pingando das calhas. Se abrir os olhos, verá que todos os sons são produzidos por crianças, com gestos compassados, como o estalar de dedos, fricção de mãos e batidas na mesa, seguidas, logo após, por notas musicais de pequenas flautas, que substituem o ruído da chuva e leva-nos ao céu, com direito a coro de anjos e querubins.
Em um momento como este é que se conclui: nada melhor do que a música para harmonizar o coração e sentir que a paz é possível. Este é o estado de espírito a que nos remetem crianças e adolescentes do Projeto Acolher Bombeiros, durante as aulas de música que envolvem coral, percussão e flauta. A maioria das crianças participa das três modalidades, outras, participam somente das aulas com as quais têm mais afinidade e apreciam de perto as demais aulas.
Eric, Cristhofer e todos os demais companheiros de aula estão entusiasmados com este novo mundo, descoberto há cerca de quatro meses, quando tiveram início as aulas de música no Projeto.
Cristhofer Ferreira de Oliveira (12) participa de todas as aulas de música, que englobam flauta, coral e percussão e já tocou música para seu pai, como presente do Dia dos Pais. ”Gosto muito das aulas e de mostrar a minha família e às outras pessoas o que aprendi. Já toco sozinho algumas músicas, como Titanic, Alegria e My Bonnie, e quando canto ou toco sinto uma harmonia muito grande”, diz o garoto, afirmando que futuramente pretende também aprender violão”.
Já o garoto Eric Gomes Régis (11), que também participa de todas as aulas, afirma sentir-se muito feliz ao tocar e ouvir o som que produz com a flauta: “Além de tocar aqui no Projeto, ensaio para os companheiros do Nosso Lar, onde moro há quatro anos, para levar alegria também a eles. Mesmo sem partitura, aprendi sozinho a tocar outras músicas, principalmente as de Lady Gaga”, explica.
Essas conquistas são proporcionadas às crianças do Projeto Acolher Bombeiros por iniciativa da Secretaria Municipal de Ação Social, dentro de um processo de inclusão social. As aulas são ministradas pela professora Nedina Carvalho Leite, música reconhecida em Rio Claro e região, nos períodos da manhã e da tarde, contemplando 45 crianças com 4 horas de aula semanais.
“As crianças apresentam um bom aproveitamento, estão conhecendo novas músicas e instrumentos que geralmente não estão muito na mídia, como a flauta. Procuro levar a eles outro universo musical, com repertório mais rico para que eles possam escolher”, diz Nedina.
Rodeada pelos alunos e com o violão nas mãos a professora conta que, atualmente, a flauta é vista como um brinquedo e não como instrumento musical. “Geralmente, é dada pelos pais na pré-escola ou nos primeiros anos de ensino fundamental e não é levada a sério. Entretanto, para saber toca-la é preciso seriedade e estudo”.
A coordenadora do Projeto, Izabel Cristina Colin Degasperi ressalta que as aulas de música mudaram o comportamento das crianças, pois trouxeram mais calma e disciplina entre elas durante as atividades. “Também os pais estão muito satisfeitos com essa inovação, já que as mudanças positivas são notadas também em casa. “Muitos deixaram de lado as brincadeiras de rua, o vídeo-game e a TV, para dedicar-se ao estudo da flauta, que foram adquiridas pela Casa Transitória”, relata.
Sobre o Projeto Acolher Bombeiros
O Projeto Acolher Bombeiros é desenvolvido pela Secretaria Municipal de Ação Social, em parceria com o Corpo de Bombeiros e com a Casa Transitória, nas dependências do Batalhão de Corpo de Bombeiros, situado à Avenida Brasil, nº 980 – Vila Martins. Embora tenha vagas para 60 crianças, atualmente atende 45 crianças (24 no período da manhã e 21 no período da tarde), na faixa etária de 10 a 14 anos e onze meses, sempre no período extra-escolar.
Além da música, os alunos se ocupam com atividades de artesanato, cultura e lazer. Uma vez por semana recebem a visita de uma pedagoga que os orienta em suas dificuldades escolares. Além de uma coordenadora, duas monitoras, uma cozinheira e uma auxiliar de cozinha, fazem parte da equipe uma assistente social e uma psicóloga, as quais acompanham o quadro psicosocial das crianças e desenvolvem entre elas atividades focando temas polêmicos como bullyng, dentre outros. Durante sua permanência no Projeto as crianças recebem café da manhã ou da tarde e uma refeição.
As inscrições para interessados podem ser feitas durante o decorrer do ano e as crianças são admitidas após passarem por um processo de avaliação com foco no perfil socioeconômico. Como o espaço para as atividades é muito pequeno, o número de vagas limita-se a 30 crianças por período.