Segundo estimativas do subprefeito, Luiz Capp Júnior, o distrito de Assistência tem, atualmente, população que se aproxima de 2.000 habitantes, incluindo a zona rural ao redor.
Pequeno no tamanho e não tão avantajado na população, o distrito vem se destacando como exemplo em boas práticas ambientais; na separação do lixo para a reciclagem, principalmente.
O processo funciona bem no distrito, o que contribui para o meio ambiente, considerando que este material poderá retornar ao mercado sob a forma de novos produtos, sem desperdiçar matérias primas e também garantindo a longevidade do aterro sanitário, onde se deposita o lixo orgânico, reconhece a direção da empresa Ambientelix, responsável pelo serviço em Rio Claro.
A diretoria de Resíduos Sólidos da Secretaria Municipal de Planejamento Desenvolvimento e Meio Ambiente (Sepladema) ratifica a ação desenvolvida no distrito. “Pode-se afirmar que quase a totalidade do lixo reciclável produzido em Assistência está sendo realmente destinado à reciclagem”, corrobora a diretora do setor, Regina Ferreira da Silva. A estimativa é reafirmada pelo gestor ambiental pela cooperativa do município, a Cooperviva, Valdemir dos Santos Lima. “Estamos recebendo de 30 a 40 bags por mês daquele distrito, e cada um contém de 20 a 50 kg de materiais recicláveis – basicamente papel, papelão, plástico, latinhas de alumínio e vidro, excluindo sucatas”, relata.
Em média, portanto, o distrito recolhe aproximadamente duas toneladas de recicláveis por mês. Percentualmente, a quantidade corresponde a 2% do total de 100 toneladas coletadas pela cooperativa no município, quantia que é reduzida a 80 toneladas quando se leva em conta apenas o que pode ser comercializado após a triagem dos materiais. A vice-presidente da Cooperviva, Inair Francisca da Rocha Marcelina, observa que a cooperativa, que tem na presidência Maria Aparecida de Oliveira, funciona com um pouco mais de 30 cooperados e 15 deles se envolvem diretamente com a coleta nas ruas.
Os bons resultados de Assistência se devem, em boa parte, ao comportamento da população, das donas de casas, comerciantes e estudantes, que se mostram muito empenhados em garantir essa reputação nascente de distrito ecologicamente correto. O maestro que orquestra sozinho este trabalho é um nordestino evangélico, devotado à crença, à causa ambiental, à comunidade e, sobretudo, a um Deus que, segundo ele, “é o mesmo de todas as demais religiões”, o que desautoriza preconceitos quanto ao credo. “Religião é prática, é respeito ao próximo, ninguém é melhor que ninguém”, prega este homem vivido e calejado. Ele é Manoel Albino Nunes, 74. Ou, simplesmente, ‘Seo’ Neco, como todos o conhecem em Assistência.
Diariamente, ele percorre as ruas do distrito com uma velha carroça puxada pela égua Morena, animal resistente que já beira os 10 anos. Os moradores deixam sua cota de lixo reciclável em frente às casas, já pronta para a coleta. Muitos deles, porém, poupam o esforço do velho catador, entregando os materiais diretamente no pequeno depósito deste benfeitor da vida e do meio ambiente. Outros usam a tecnologia e recorrem ao celular do ‘Seo’ Neco para chamar o carroceiro-ambientalista, que atende todos os pedidos para retiradas urgentes de caixas de papelão e outros materiais apropriados para a reciclagem. Este, aliás, é o único luxo a que se permite o nobre catador: um celular, que melhora muito o rendimento do serviço.
Aceito, há uns quatro meses, como membro da cooperativa que reúne catadores de recicláveis em Rio Claro, a Cooperviva, este mais novo cooperado passou, a partir daí, a destinar todo o resultado de seu trabalho à entidade. Os enormes fardos, com toneladas de recicláveis, são retirados periodicamente pela cooperativa, que leva o material para sua sede, no Distrito Industrial, onde é feita a triagem (separação) dos materiais e, depois, a comercialização para as empresas receptoras, que fazem a reciclagem propriamente dita. ‘Seo’ Neco, evidentemente, recebe pelo trabalho suado que exerce.
Em Assistência, o termo reciclagem está na boca das crianças, dos pais, avós e aparentados. Arthur, 14, e Gabriel, 13, integram este exército crescente de recicladores. “Sei que isso é importante, faço questão de contribuir para ver as ruas limpas e o lixo reciclável ser novamente transformado em coisas úteis”, ensina Gabriel, que cursa a sétima série. O pai, Plínio Dal Pino, 52, proprietário do que ele domina um Ateliê de Mecânica, é o incentivador dos meninos. “Todo mundo aqui em casa faz a separação do que pode ser reciclado e posteriormente levamos diretamente para o depósito do ‘Seo’ Neco”, explica o comerciante.
De retirante a agente da reciclagem
Os quase 2.600 km que separam a cidade de Sousa, no sertão da Paraíba, de Rio Claro, foram vencidos há 30 anos, por ‘Seo’ Neco e sua numerosa prole. Fugiam da miséria extrema, da seca, da falta de trabalho e da dor dilacerante representada pela morte de um casal de filhos, em tenra idade. “Quando as duas crianças morreram, veio o desespero, a desilusão, achei que aquela situação de pobreza e necessidade não dava mais para suportar”, conta Neco, apelido que Manoel carrega desde pequeno.
A viagem só foi possível por intercessão de uma sobrinha que já residia em Rio Claro à época, no distrito de Assistência. “Ela conversou com conhecidos, amigos, contou o que se passava com a gente lá no sertão e todos se uniram para juntar um dinheirinho que ajudou a pagar as despesas da nossa vinda”, simplifica Neco. Nestas três décadas, o retirante permaneceu e se estabeleceu no pequeno distrito de Rio Claro, às margens da rodovia que liga o município a Piracicaba.
Em Assistência, ele se tornou o que se convencionou chamar de figurinha carimbada. Todos o conhecem e os que privam um tanto mais de intimidade com ele, não enrolam a língua ao defini-lo. “É um homem bom, tão bom que, às vezes, os outros até se aproveitam de sua bondade”, dispara o comerciante José da Silva Lippert, mais conhecido por Juca. Aos 74, com a expressão cansada, rosto crivado de ranhuras esculpidas pelos anos, Neco faz gosto em ser lembrado pela bondade. “Graças a Deus”, agradece. “É uma família boa, muito simples”, confirma uma das vizinhas, Marisa da Silva Franco, que reside no distrito há 36 anos e reserva todo o lixo reciclável de sua residência para entregar ao esforçado vizinho.
Limitado, na linguagem escrita, à assinatura do próprio nome, “só do primeiro”, ressalva, que foi ensinado há muitos anos por uma das filhas, e ainda assim porque precisava “por causa de trabalho”, ele fala pausadamente, tem boa fluência, pronuncia corretamente as palavras e ganha seus interlocutores pela educação e cordialidade. Religioso, com um templo da Congregação Cristã no Brasil praticamente no quintal de sua casa, ele quase não incorre em erros na fala, evidência de que se a leitura inexiste em sua vida, os ouvidos foram bem treinados e disciplinados, ensinando-o a articular as frases e a se comunicar com um vocabulário muito acima do razoável.
A matemática, todavia, foi subvertida por este senhor extremamente simpático e generoso: ele teve 12 filhos e, hoje, abençoa 47 netos. A esposa, Silvina, 76, é companheira com divide o teto há 52 anos.
Sempre disposto para o trabalho, para a família, para a comunidade e disponível para propagar seu credo – com muito tato, diplomacia e amor – ‘Seu’ Neco tem uma compreensão surpreendente do espírito humano. “Não cabe a nós destratar ou reprovar quem quer que seja”, diz. “Aquele que hoje está em pé, pode cair, e o que está no chão, pode se levantar, e entre os que podem cair e se elevar, estamos todos nós” conclui.